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Projeto que incentiva a cultura da viola de cocho é semifinalista em premiação nacional

Leonardo Cabral em 04 de Agosto de 2020

Anderson Gallo/ Diário Corumbaense

Projeto da professora de música teve início em 2013

O Projeto Piloto "Música e Patrimônio”, de autoria da educadora musical, Leidiane Garcia, é semifinalista do Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade 2020. A premiação é realizada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e deve indicar os finalistas neste mês.

O projeto selecionado entre muitos, que representavam os quatro cantos do país a nível cultural, tem como base um dos símbolos da cultura pantaneira, direcionado especificamente ao Patrimônio Imaterial, com o modo de fazer e tocar a viola de cocho, assim como cantar e dançar o Siriri. Tudo isso, é desenvolvido com estudantes da Escola Municipal Cássio Leite de Barros, localizada na parte alta de Corumbá.

Para a educadora, ser semifinalista em um prêmio tão importante em nível nacional traz a sensação de reconhecimento. “Só pelo fato de chegar à semifinal eu me sinto ganhadora, é um espaço de direito essa evidência, tanto no meu caso, quanto para as crianças. É o resultado de um trabalho que cultivamos ano a ano. Se chegar a ganhar será ótimo, pois aí teremos outras possibilidades de investir em recursos, para que eu possa levar para a sala de aula  uma quantidade maior de instrumentos que estejam de acordo à faixa etária e a proporção física de cada um. É um prêmio importantíssimo”, disse Leidiane ao Diário Corumbaense.

Promovido pelo Iphan desde 1987, o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade prestigia, em caráter nacional, as ações de preservação do patrimônio cultural brasileiro que, em razão da originalidade, vulto ou caráter exemplar, mereçam registro, divulgação e reconhecimento público.

A premiação é oferecida, anualmente, a empresas, instituições e pessoas de todo o Brasil, e tem destacado, ao longo dos anos, a diversidade e a riqueza do Patrimônio Cultural Brasileiro (material e imaterial) em suas manifestações culturais, antigas e modernas, curvas da arquitetura nacional ou em grandiosas paisagens arqueológicas e naturais. O nome do Prêmio é uma homenagem ao fundador do Iphan a fim de destacar as iniciativas que compartilham dos mesmos ideais. O advogado, jornalista e escritor Rodrigo Melo Franco de Andrade nasceu em 1898, em Belo Horizonte (MG).

Oito anos atrás

O projeto de Leidiane teve início em 2013, quando então, começou a ganhar outras formas e nomes. Começou na escola municipal Cássio Leite de Barros, onde a professora iniciou o trabalho com música na disciplina Arte, trabalhando com a cultura popular, fazendo o processo de educação patrimonial junto com os alunos.

“Nesse ano, os alunos estudaram um pouco de teoria musical e tocaram instrumento, estudaram teoria aplicada em instrumento e também escreveram alguns temas rítmicos para tocar nos instrumentos musicais que eu levava para a sala e que era do meu acervo pessoal. Com isso, foi ganhando forma e corpo o projeto que, além do prêmio deste ano, já foi inscrito em outras premiações tanto nacionais como locais”, explicou Leidiane Garcia.

Ela ainda menciona que, ao longo desse período, entre premiações e as atividades dentro da sala, criou também um grupo dentro da escola com os alunos, para que, juntos, conseguissem socializar o produto desenvolvido em sala de aula e também o levasse em apresentações externas, como o Grupo Vocal de Percussão de Siriri e o Grupo de Dança do Siriri. “Se não fosse a condição da pandemia daria continuidade a essas ações que habitualmente a gente tem realizado”, relembrou a professora.

Educação é o caminho e as crianças são multiplicadoras

Perguntada sobre educação e arte, Leidiane não pensou duas vezes e logo afirmou que a Educação é o caminho, ou seja, é o percurso que essas crianças têm para acessar os bens culturais.

“Se não fosse através da escola, de que forma esses alunos sairiam do espaço da própria unidade de ensino, para conhecer um teatro? Tenho alunos que foram fazer apresentação no Festival América do Sul, eles foram o foco. Em que outras condições, sendo elas, através dessas ações desenvolvidas na disciplina Arte, dentro da escola, eles conseguiriam?”, questiona a professora.

Anderson Gallo/Diário Corumbaense

Viola de cocho é um instrumento musical singular quanto à forma e sonoridade

Ela ainda reforça que os ensinamentos vão além. Pois oferece bolsa para os alunos estudarem violão e viola de cocho. “Tudo isso ocorre na minha casa, algo que não é da minha obrigação, mas sinto a necessidade de fazer para que eu tenha mais resultados. E isso é resultado da Arte, que proporciona um olhar diferente, com a importância da Cultura. Único espaço e único meio palpável de fazer que existam conhecimentos transmitidos de geração em geração, como as oficinas que proporcionam o contato direto”.

Com o projeto, a professora também busca manter viva a cultura da viola de cocho. Um dos precursores, o mestre cururueiro Agripino Magalhães, faleceu no dia 26 de abril deste ano, aos 101 anos de idade. “O meu projeto é um exemplo de ação para ser realizado em sala de aula. De apresentar não só os conhecimentos estruturados e produzidos historicamente, mas também de aproximar os mestres, trazê-los para a sala de aula. Costumo dizer que são meus amigos”, completa Leidiane.

A viola de cocho

A viola de cocho é um instrumento musical singular quanto à forma e sonoridade, produzido exclusivamente de forma artesanal, com a utilização de matérias-primas existentes na região Centro-Oeste do Brasil. Sua produção é realizada por mestres cururueiros, tanto para uso próprio como para atender à demanda do mercado local, constituída por cururueiros e mestres da dança do siriri. O Modo de Fazer a Viola de Cocho foi registrado no Livro dos Saberes, em 2005.

Anderson Gallo / Diário Corumbaense

O nome deve-se à técnica de escavação da caixa de ressonância da viola em uma tora de madeira inteiriça, mesma técnica utilizada na fabricação de cochos (recipientes em que é depositado o alimento para o gado). Nesse cocho, já talhado no formato de viola, são afixados um tampo e, em seguida, as partes que caracterizam o instrumento, como cavalete, espelho, rastilho e cravelhas. A confecção, artesanal, determina variações observadas de artesão para artesão, de braço para braço, de forma para forma.

Os materiais utilizados tradicionalmente para sua confecção são encontrados no ecossistema regional, correspondendo a tipos especiais de madeiras para o corpo, tampo e demais detalhes do instrumento; ao sumo da batata ‘sumbaré’ ou, na falta desta, a um grude feito da vesícula natatória dos peixes (ou poca) para a colagem das partes componentes; a fios de algodão revestidos para trastes (que, na região, também são denominados pontos) e tripa de animais para as cordas.

Sua confecção, feita de forma artesanal, determina variações observadas de artesão para artesão, de braço para braço, de fôrma para fôrma. As violas podem ser decoradas, desenhadas a fogo e pintadas, ou mantidas na madeira crua, envernizadas ou não. As fitas coloridas amarradas no cabo indicam o número de rodas de cururu em que a viola foi tocada em homenagem a algum santo – que possui, cada qual, sua cor particular.

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