PUBLICIDADE

Protesto pela morte de Vanessa reúne famílias de outras vítimas de feminicídio

Campo Grande News em 15 de Fevereiro de 2025

Juliano Almeida

Jornalistas e amigos participaram de protesto pela morte de Vanessa

Protesto pedindo justiça pela morte da jornalista Vanessa Ricarte, 42 anos, no centro de Campo Grande reuniu familiares de outra vítima de feminicídio e cujo autor segue impune. Ana Cláudia Rodrigues Marques, de 44 anos, foi assassinada pelo ex-marido junto com o então namorado, Carlos Augusto Pereira de Souza, 49 anos, em novembro do ano passado. Ambos foram mortos pelo empresário Flávio Saad, de quem Ana Cláudia estava separada há dois anos. Ele continua foragido.

“Quando vimos a história da Vanessa é como se tivéssemos revivido todo aquele novembro do ano passado, ficamos chocados”, disse o irmão de Ana Cláudia, Átila de Nascimento, 37, servidor público.

Divulgação/PCMS

Polícia divulgou variações da aparência de Flávio Saad

Ele, a irmã mais nova, Mirella Rodrigues, 27, e uma amiga, Rosane Nely decidiram acompanhar a manifestação e também cobrar das autoridades que o autor seja preso. “Viemos prestar nosso apoio, porque sabemos o que a família da Vanessa está passando, mas também cobrar que ele pague o que tem que pagar”, enfatizou.

Jornalistas, amigos e políticos estiveram presentes no ato, realizado em frente ao Bar do Zé, na esquina na rua 14 de Julho com a Barão do Rio Branco. A senadora Soraya Thronicke (Podemos) falou da necessidade de desburocratizar o sistema de medidas protetivas, facilitando a intimação dos agressores. Ela ainda sugeriu mudança na lei para que policiais e até advogados pudessem entregar o documento e iniciar a vigência da medida protetiva.

A vereadora Luiza Ribeiro (PT) também se manifestou e reclamou da estrutura da Casa da Mulher Brasileira que classificou como “sucateada” e cobrou providências da Justiça e do Poder Executivo sobre o caso. Disse ainda que o local está sem coordenadora nomeada pela Prefeitura de Campo Grande.

Pelo Sindjor (Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Mato Grosso do Sul), a representante da comissão de ética, Tainá Jara, reforçou o fato de que mesmo usando todos os instrumentos que tinha em mãos, a jornalista Vanessa, acabou morrendo. “Houve uma falha na rede de proteção e isso precisa ser esclarecido. A Vanessa, que sabia e uso de todos os seus direitos, não foi protegida”, sustentou.

Áudio

Áudio da jornalista Vanessa Ricarte, enviado a um amigo após ser atendida pela Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) mostra que a própria polícia induziu ela a voltar para casa onde foi brutalmente assassinada com três facadas no peito pelo ex-noivo, Caio Nascimento, na quarta-feira (12).

Reprodução/Rede Social

Vanessa Ricarte era servidora do Ministério Público do Trabalho de MS

No áudio, ela relata que foi atendida de forma fria pela delegada, que o noivo estava sendo protegido e que foi mandada de volta sem apoio. No mesmo dia, no fim da tarde, ela foi assassinada. Vanessa chegou a ser resgatada, mas morreu por volta das 23h55 de quarta-feira depois de passar por cirurgia na Santa Casa de Campo Grande. O autor do feminicídio está preso.

O delegado-geral da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul, Lupérsio Degerone Lucio, deu um posicionamento sobre os relatos divulgados em áudio e afirmou que por orientação do governador do Estado, Eduardo Riedel (PSDB) e da Sejusp (Secretária Estadual de Justiça e Segurança Pública), foi instaurado um procedimento para apurar a situação. "Quero enfatizar que tivemos uma reunião para aprimorar o atendimento às vítimas no âmbito da delegacia até o posterior deferimento das medidas".

Confira a íntegra do áudio de Vanessa Ricarte enviado a um amigo:

Não aconteceu nada, porque assim, eu fui falar com a delegada, fui tentar explicar toda a situação e do jeito que ela me tratou também, bem prolixo, sabe? Bem fria, seca e ela toda hora me cortava assim, eu queria entender, quem que é essa pessoa? Vê o histórico da pessoa e falou para mim que não podia passar o histórico dele, mas que eu já sabia, porque ele mesmo tinha falado de agressões.

Aí eu falei: "Não, que eu queria entender a natureza dessas agressões". Porque ele falou para mim que foi porque a mulher ameaçou a filha dele, enfim. Aí ela falou: "Não, você aí, você não vai falar, eu não vou, não posso te passar isso aí, é sigiloso, sigilo". Sim, parece que tudo protege o cara, né, o agressor. E aí ainda não foi nem mandado, tem que ter um mandado, né, judicial.

Então, hoje, por exemplo, não tem como ele assinar essa medida protetiva e passou aqui o telefone da oficial de justiça, né? Passou a senha do processo para eu ficar consultando. E do boletim de ocorrência, ela falou que não adianta acrescentar, porque não vai mudar muita coisa, porque já foi para o judiciário.

E ele tá aí me perguntando, se eu falo com você, seu pai conversa comigo, você não conversa nada. Eu falei, mas eu preciso voltar para a minha casa, preciso tomar banho, faz dois dias que eu não tomo banho, troco de roupa. Aí ela 'então vai para a sua casa, você já avisou ele, manda uma mensagem falando para deixar a casa'. Então assim, eles não entendem né, a dimensão do negócio. Porque ele já tinha falado para mim que só saía de casa com a polícia. Mas de qualquer forma, eu vou ter que ir lá na casa e vou falar com ele isso aí.

Se ele falar que ele não vai sair, aí eu vou ter que acionar a polícia. Aí meus pais estão vindo, já vão brigar comigo, tudo porque falar que eu fui precipitada, que esse cara depois vai me matar e tal, não tem o que fazer, porque ele só vai preso se tiver flagrante. Por isso que ele não foi preso no caso da Leca, né? Ele fugiu do local do crime. Ele não tinha flagrante, não sei como que esse cara não foi preso depois.

E, eu tô aqui, pensando, raciocinando o que a gente pode fazer. E se for preciso, sei lá, aciona a doutora Cantes para ela acionar o MP, que é através do marido dela. Sei lá. É uma coisa desse sentido, é uma via que eu tenho, né?

E é isso, assim, eu tô bem, bem impactada com o atendimento da Casa da Mulher Brasileira, sabe? Eu que tenho toda a instrução, escolaridade, fui tratada dessa maneira, imagina uma pessoa, uma mulher vulnerável lá, pobrezinha, vamos dizer assim, chegar lá toda vulnerável sem ter uma rede de apoio nenhuma. Chegar lá, essas que são mortas, né?

Essas que vão para estatística do feminicídio. E é isso. Eu tô esgotada mentalmente falando. Perdida, sabe? Tô decepcionada. Aí eu tô me sentindo culpada, porque eu fui registrar o BO hoje de madrugada. Sabe, não briga comigo.

É uma coisa assim que eu fiquei chateada com meu pai falando: "Não, esse cara pode pegar depois, você não sabe o que vai dar e tal, não sei o quê". Então, eu fazendo ou não fazendo pelo que você disse, né? Eu não fazendo ou fazendo o boletim de ocorrência, ele pode me agredir de qualquer maneira, né?