Curso de artesanato com fibras de camalote ou aguapé – planta aquática do Pantanal – oferece noções de todo o processo artesanal, de técnica indígena, que envolve essa forma de arte
Camila Cavalcante em 26 de Outubro de 2009
Oficina de artesanato com fibras de camalote ou aguapé – planta aquática do Pantanal – oferece noções de todo o processo artesanal, de técnica indígena, que envolve essa forma de arte. A oficina, oferecida no Moinho Cultural, terá duração de nove dias, e iniciou na última semana. Esta é a segunda turma, a primeira foi em setembro deste ano e outras virão até dezembro. As aulas ocorrem sempre das 08h ao meio-dia. A professora é a índia guató Catarina Ramos da Silva. “A proposta é oferecer à família dos pescadores que se encontram em situação difícil no período de piracema uma nova capacitação. Sabemos que o governo oferece um benefício àqueles que são cadastrados. Nós visamos todos os que dependem da pesca e que não possuem alternativa de renda. O curso está aberto para toda a comunidade que se interessar, mas seu principal foco é a comunidade que depende da pesca para sobreviver”, explicou Márcia Rolon, gerente do Instituto Homem Pantaneiro, que promove a oficina.
O curso de artesanato oferece noções de coleta do aguapé, da secagem e escolha do material, da técnica de trançar as fibras e da moldagem das peças. “Trabalho com o artesanato de aguapé há 35 anos, produzo todos os tipos de peças e em Corumbá sou a única artesã que trabalha exclusivamente com esta vegetação. Toda a técnica repassada aos alunos é da minha tribo, a Guató”, disse a professora Catarina ao Diário. É possível confeccionar todo tipo de objeto. Basta apenas a imaginação e o treino contínuo. “As pessoas podem construir peças de todas as formas e tamanhos. Desde um porta-copos até um tapete de 3 metros, no caso, a maior peça que produzi. Os preços variam de acordo com a peça, vão de R$ 2 a R$ 500. Creio que seja uma ótima fonte de renda, pois é acessível a todas as pessoas. Às vezes deixo de fazer encomendas, pois não tenho tempo de terminá-las, trabalho não irá faltar para meus alunos, depende da força de vontade deles.”
“Sou funcionário público, mas adoro artesanato, é algo que funciona como terapia. Faço trabalhos em jornais, como cestas, abajur, diversos objetos. Há muito tempo queria aprender a fazer artesanato de aguapé. Apesar de parecerem peças parecidas, os objetos de aguapé são diferentes daqueles feitos de papel, a técnica de trançar é bem diferente, o trabalho é difícil, mas quando vemos a peça pronta, é bem recompensador”, disse Gilberto Chena Rolon, o primeiro aluno homem de dona Catarina. “É a primeira vez que dou aulas de artesanato, estou satisfeita, pois noto que os alunos estão realmente interessados, como foi o caso do Gilberto, mesmo tendo serviço fixo, não deixa de se dedicar ao artesanato, ele foi um excelente aluno, participou da primeira turma do curso”, argumentou a professora. “Soube do curso de artesanato pelo meu neto que estuda no Moinho pela manhã, e ele me avisou que o trabalho era parecido com os tapetes de retalhos que eu confecciono. Sou aposentada e faço tapetes de retalho para vender, os preços variam de R$ 15 a R$ 50. Fiquei empolgada quando vi o trabalho, ele é bem natural e posso conseguir um aumento nos lucros com a venda das peças”, contou a aluna Everalda Mercado Silva.
Cultura indígena
As técnicas de produção dos artesanatos feitos de Aguapé são todas indígenas. “Existem vários tipos de Aguapés, alguns deles, o Folha de Lanço, deve ser colhido somente na lua minguante, ele fica mais resistente e por possuir algumas fibras cor-de-rosa, as cores ficam mais salientes. Depois da secagem, os fios são limpos, tiramos as partes duras e os preparamos para tranças. Agora vem o segundo segredo, o processo de trançar deve ser feito à noite, sobre o sereno, para que as fibras trançadas não ressequem. Como nosso curso é durante o dia, peço que os alunos molhem constantemente as mãos para hidratar a fibra. O terceiro segredo é a costura, a linha de algodão deve ser encerada com mel de abelha para que corra com maior facilidade e conserve por mais tempo, porém isso não é possível, porque aqui na cidade há muitos insetos, não conseguimos ter uma boa peça, pois elas acabam sendo devoradas pelos insetos daqui, então utilizamos a linha de algodão sem a cera”.
Segundo a professora, o mais difícil é trançar, uma vez que não deve ser feita de qualquer forma. A fibra, no início do trançado, deve ser presa ao pé com a perna esticada na horizontal, se a perna ficar na vertical, dobrada, a trança sairá torta. “Essa posição é muito cansativa, eu já estou acostumada, mas os alunos reclamam dessa fase do curso e como é necessário produzir metros e metros de trançado, às vezes eles passam um dia inteiro trançando. A minha proposta é essa, repassar o curso como o processo é feito na tribo, é claro, que as adaptações estão sendo feitas de acordo com as necessidades”, concluiu Catarina.