Supermercado de Corumbá oferece oportunidade de emprego para integrantes do projeto "Mãos pra que te quero"
Camila Cavalcante em 24 de Setembro de 2009
Há dois meses um supermercado de Corumbá está oferecendo a oportunidade de inserção de deficientes auditivos no mercado de trabalho. O estabelecimento já oferece há mais de oito anos oportunidades para aqueles que muitas vezes são excluídos por possuírem alguma deficiência. “A empresa acredita que não há diferença entre os deficientes e não deficientes, pois há momentos em que todos nós somos deficientes em alguma parte da vida”, declarou Marcos Antônio Panovitch, proprietário do estabelecimento comercial.
Hoje, quatro alunos surdos do projeto “Mãos pra que te quero”, da professora especialista Maria Cristina Maia de Souza estão empregados. “A maior queixa que eu tinha dos meus alunos era que eles procuravam emprego e não encontravam. Eles sentiam muito preconceito. Quando encontravam era para limpar chão, cuidar de lixo, e sendo que muitos deles só tiram nota dez na escola. Era uma situação muito confusa, agora esses quatro que já se encontram empregados dão força para aqueles que ainda estão lutando”, explicou a professora.
“Nossa empresa não faz caridade, apenas cumprimos com a legislação. Se as leis permitem o acesso dos deficientes na área de trabalho, o nosso dever é cumpri-las. Esses quatro jovens não tiveram problema de adaptação. Ao contrário, estão sempre motivados. Eles têm carteira assinada, salário e todos os demais direitos”, completou Panovitch ao Diário.
Aos 33 anos, Revanil Márcio, conseguiu seu primeiro emprego. “Estou muito satisfeito, sou auxiliar de padeiro, pensei que nunca fosse ter uma oportunidade de emprego. No começo fiquei receoso, pois perderia o auxílio salarial que o governo concede aos portadores de deficiência, mas depois refletindo, vi que realmente sou capaz de trabalhar e ter meu próprio dinheiro. Isso me motiva a viver” disse em Libras, traduzidas pela professora.
O primeiro aluno de Cristina a trabalhar no supermercado foi Jean. “Trabalho desde os 12 anos, mas não gostava do meu antigo serviço. Eles me colocavam sempre para limpar o chão, o banheiro e o salário era pouco. Eu via as pessoas ouvintes trabalhando com outras coisas e muitas delas sempre estavam sorrindo, era sinal que gostavam do que faziam. Então eu também tinha que encontrar algo que me fizesse sorrir. Pedi à minha mãe para vir aqui no Panoff ver se eles tinham um emprego para mim, e pra minha surpresa a resposta foi sim, já estou aqui há dois meses”, relatou Jean Izidoro Arruda, hoje com 21 anos, e trabalhando como repositor.
O fato de não falarem não é problema para a comunicação com os demais funcionários. “Trabalho diretamente com eles e percebo que estão sempre motivados. Certa vez um cliente começou a perguntar o preço do produto a um deles, que por não ouvir acabou por não responder é claro. O cliente revoltado veio se queixar de que o repositor havia o tratado mal. Com toda calma, nós explicamos a ele que nosso empregado era deficiente auditivo, o cliente ficou muito constrangido e acabou se desculpando”, contou o supervisor Carlos Bittencourt.
“Para facilitar a inclusão de todos, pretendemos oferecer um curso de Libras para todos os nossos funcionários”, revelou Marcos Panovitch. “Já convivo há algum tempo com pessoas surdas, não estamos tendo dificuldade aqui no serviço com os meninos, eles são muitos carismáticos. Muitas vezes nos dizem o que pensam com um simples olhar, é impressionante, eles são muito expressivos. O curso de Libras com certeza nos auxiliará e muito no convívio”, disse a balconista Rejane Souza.
O projeto
O projeto "Mãos pra que te quero" funciona na casa da própria professora Cristina no período da tarde há cerca de três anos. “Uma sede para o projeto está em construção na escola estadual Júlia Gonçalves Passarinho, porém enquanto ela não se concretiza temos que executar o trabalho em minha casa. A distância atrapalha um pouco, pois moro em Ladário e muitos deles em Corumbá. No projeto ensino a Língua de Sinais. É uma troca, os surdos possuem uma cultura própria, eles são avessos à mudança, gostam de rotina e são muito carinhosos. Acabamos por realizar sempre uma troca de culturas, eu com a dos ouvintes e eles com a dos não ouvintes. Tenho um papel social também a cumprir, não posso apenas ensiná-los a se comunicar, devo ensiná-los a se integrar’, explicou Cristina ao Diário.